Tormentas Tropicais e Ventos do Norte: O Brasil nas Tramas da Nova Guerra Política

Nos dias que correm, quando os relógios da diplomacia marcam tempos inquietos e os mapas do mundo se retraçam conforme os humores das lideranças, observa-se, com certa consternação, o desenrolar de eventos no cenário brasileiro que não mais se limitam ao solo nacional, mas que reverberam além-mar, atravessando oceanos e penetrando nos salões já outrora respeitáveis da política internacional. O Brasil, esta jovem república que ainda ensaia seus passos firmes na arena das nações, vê-se hoje enredado num drama político que ultrapassa os portões do Planalto e alcança as escadarias de Washington, onde o eco dos discursos inflamados encontra abrigo entre os que, em nome de uma liberdade mal compreendida, pregam o descrédito das instituições e a ruína do Estado de Direito.

A figura do ex-presidente Jair Bolsonaro, outrora entronizado por multidões, agora caminha sob o peso de um monitoramento eletrônico, a tornozeleira que, mais que artefato judicial, é símbolo de um tempo em que a lei insiste em recordar aos poderosos que nem todos os escudos são eternos. A imposição de tal medida por parte do Judiciário brasileiro, em consonância com os preceitos das garantias cautelares previstas em nosso ordenamento, revela não apenas a gravidade dos indícios que pesam sobre aquele que presidiu a nação, mas também a maturidade das instituições que, com serena firmeza, resistem à tentação do arbítrio.

Entretanto, o que se anuncia como um processo de justiça interna rapidamente se internacionaliza, conduzido pelas palavras de seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro, que, alçado ao púlpito em terras americanas, proferiu falas que beiram, se não transpassam, os limites do aceitável em matéria de soberania e responsabilidade política. É grave — para não dizer inaceitável — que um representante eleito pelo povo brasileiro utilize espaço estrangeiro para desacreditar os tribunais de sua pátria e fomentar a desconfiança internacional sobre o funcionamento de nossa democracia. Há, nesse gesto, não apenas um erro de cálculo político, mas um possível atentado contra a dignidade nacional, o que, à luz da nova Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito, pode ser entendido como tentativa de enfraquecer as bases que sustentam a ordem constitucional.

No mesmo compasso, rumores oriundos da seara republicana dos Estados Unidos dão conta de que o senhor Donald Trump, figura que, a exemplo de Bolsonaro, trilha o caminho da revanche política, teria manifestado a intenção de impedir o ingresso do Ministro Alexandre de Moraes no território norte-americano. Tal declaração, ainda que informal ou precipitada, constitui não apenas um desacato a um membro do Supremo Tribunal Federal, mas uma afronta ao princípio da reciprocidade e da boa-fé que rege as relações internacionais entre Estados soberanos. Um gesto como esse, ainda que simbólico, carrega implicações sérias, podendo deteriorar o diálogo entre as nações, comprometer acordos bilaterais e, o que é mais preocupante, abrir precedentes perigosos para o tratamento de autoridades estrangeiras sob a lógica da vingança ideológica.

Essa crescente tensão, que poderia parecer uma mera querela entre figuras públicas, na realidade integra um movimento mais vasto, quase tectônico, de reconfiguração dos polos políticos globais. A extrema direita internacional, cujos tentáculos se estendem da América do Sul ao norte do continente, da Europa Oriental aos fóruns virtuais mais obscuros, articula-se com um fervor que lembra as antigas sociedades secretas do século XIX, mas com o poder multiplicado pelos algoritmos e pela velocidade da internet. A aliança informal entre Bolsonaro e Trump, selada não por tratados oficiais, mas por discursos inflamados e agendas comuns, representa um desafio inédito à diplomacia tradicional e à própria noção de soberania, pois o que se vê não é mais apenas uma política externa entre Estados, mas uma política transnacional entre ideologias.

Ora, se o Brasil deseja manter-se como ator respeitável no concerto das nações, é mister que seus líderes — atuais ou passados — se comportem com a dignidade e o decoro que a função pública exige. Os eventos recentes sugerem, contudo, que há uma tentativa deliberada de exportar para o exterior uma narrativa de crise institucional, com o intuito de angariar simpatia e apoio entre os que, ao redor do globo, compartilham de um projeto autoritário disfarçado de clamor popular. Tal estratégia, contudo, pode custar caro. As relações comerciais, os tratados de cooperação judicial, os intercâmbios educacionais e científicos entre Brasil e Estados Unidos — e, por extensão, com o mundo — são construções delicadas, feitas de confiança e estabilidade. Fragilizá-las é pôr em risco não apenas o futuro político de um grupo, mas o desenvolvimento de um povo inteiro. É tempo, pois, de prudência. A história, sempre vigilante, já nos ensinou que os ventos do populismo costumam soprar forte antes de recolher-se ao silêncio dos fracassos. Que a voz da razão prevaleça sobre os gritos do ressentimento, e que os homens públicos, em vez de alimentarem cruzadas ideológicas além-mar, dediquem-se à nobre arte de governar com sabedoria, com espírito de conciliação e, sobretudo, com respeito à verdade. Pois se a liberdade é um bem precioso, mais ainda o é a responsabilidade que dela emana.

Com afeto sereno e profundo respeito,
uma servidora das letras e da justiça com alma

Stéphanie Marocco.

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